quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Curada

Todos acham que estou curada. E além: já que curou, ela precisa ser boa para todos o tempo todo, não pode dizer não para ninguém nunca e não tem mais direito de ficar triste, nervosa, estressada nem ter uma maldita gripe ou dor de garganta. Não pode "se fazer de coitada" e não pode ficar quieta, porque isso parece que você está estranha. Tá bom pra você? Afinal você causou muito por tempo suficiente e agora você está curada e por isso você virou uma coisa que inventaram, uma máquina de não ter sentimentos, uma espécie de robô do bem.
Chega! Eu não estou curada. Eu sou limítrofe, borderline, louca, mimada vitimista seja lá mais do que você quiser chamar essa merda.  Não tô curada. Só eu sei o quanto me esforço para andar na linha, para ser uma boa mãe, para não perder a paciência. Para ser legal com os outros. Para tentar ser útil e agradável. Só eu sei a crise de identidade que passo, de vazio pessoal, do tamanho da minha baixa autoestima. De como me sinto só. Ninguém vê nada além do que quer ver, afinal, todos estão submersos em seus próprios universos paralelos, suas necessidades, seus vícios, suas manias, fabricando em suas indústrias de ego mais e mais problemas.
Eu
Também
Estou.

Não tenho cura. Vocês também não.