terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Sexo ou mentiras atraentes?



"It's fascinatin to observe what the mirror does
but when I dine it's for the wall that I set a place"

->
Richard Hell & the Voidoids

[...]

Se sou caótica?
Uma pessoa caótica. É... o caos faz sentido. Uma personalidade que me atrai é a delinqüente: que comete delitos. Um homem? Ah! Aquele que diz que é meu homem e diz também: "tão bom pegar em suas mãos!" Ele geralmente dizia isso quando estava aqui. Ele era romântico-piegas, mas eu gostava. Heróina era a minha droga, era a nossa droga. Mas não uso mais drogas desde que ele foi embora. De vez em quando, uns comprimidos de codeína, mas é difícil, sabe, tenho que masturbar o babaca da farmácia. Nojento. Mas puxo um fumo, sabe como é, eu realmente parei de usar drogas. Tu tá pensando no tédio que deve ser, né? Cheiro cola quando o tédio bate pra valer. Não, mas não faço só isso da vida, faço muita coisa também, você entende? Pra viver, e tal. Roubo umas coisas, mas só aquelas que eu acho que não vão fazer falta pro dono, sei lá, aquelas coisas que as pessoas compram e nunca usam, entendeu? Legal? Não, legal não é, háháhá, mas devia ser, né, é um meio de sobreviver. Cato coisas no lixo também. De vez em quando, as pessoas jogam coisas boas no lixo.
Não, não saio mais por aí pedindo pra ele voltar. Quando alguém precisa de você, aí sim pede pra você voltar, entendeu? Eu estou na minha. Não sou mais uma garotinha sozinha, virgem, sabe como é? Eu já dei pro bairro todo, a gente precisava levantar uma grana. Acho que se ele me amasse de verdade, ele pedia pra eu voltar.

.
.
.
.
.





sábado, 23 de janeiro de 2010

interiorizar o choque

Ossos quebrados. É difícil ser pequeno e fraco para lutar contra esse monte de babuíno do caralho!
Disputas incontáveis por restos de comida, leite coalhado ou então, para saber quem vai limpar a merda dos porcos dessa vez. Batalha perdida, sempre.
Às vezes, vou dormir com a porra do estômago roncando. Não tenho vez, as hienas mortas-de-fome já brigaram pelo seu pedaço de carniça. A lei do mais fraco é: foder-se o máximo que puder.
Acontece também de algum parasita se instalar no meu corpo. É assim: O verme come toda a sua comida e depois caga dentro de você.
Cara, aqui o teor de comportamentos instintivos dos bichos é muito perigoso, é um verdadeiro cada-um-por-si num quadrado de cimento onde estamos enjaulados.
Por fim, percebo que sou o animal inválido do lugar e resolvo tomar um monte de remédios para dormir porque dormir para sempre seria um bom remédio.



quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

desordem neurológica



A sociedade nada mais é que a selva, eu sou o coelhinho doente mental e frustrado, perdido nesse monte de lixo, banido da turma de coelhos-normais. Fodam-se os coelhos normais, trepando e procriando o tempo inteiro, fugindo de qualquer perigo, comendo cenoura em suas tocas ocas. fantasio-me de lobo-mau-faminto-muito-faminto-e-pederasta, enfio cenouras em seus cuzinhos sujos, como a carne crua de suas caras lavadas, sem pestanejar.
Envolvo-me em problemas patéticos, entro em ruas sem saída, ouço ruídos estranhos na casa. Déficit de atenção e discalculia; erros ortográficos: puro charme. Cocaína faz bem para o coração, cola para ativar neurônios, gotas de codeína na comida, chá-verde, domingos pútridos como o ventre em decomposição de uma puta do Brás. A vida em cor-de-rosa.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

maldade refletida: oferecer-me.



Olha, eu gostaria tanto de ser ao menos engraçado! Eu gostaria tanto de nunca mudar de lado. Eu gostaria que você nunca partisse e eu ficasse, sem nada. É, sem nada e nessa confusão. O que é que vou fazer?
Eu acho que estou impotente, um Arturo Bandini viciado em fracasso.
Minha idiotice maior, é não perceber o mundo sem você, manter-me acordado, fumando cigarros baratos na janela do meu quarto a meia-luz, e gostar tanto de sofrer.
Cai na inocência de querer ser mal. Tá vendo só? Nem isso consigo ser, e acabo sempre doando tudo de mim pra ti, distribuo meu amor em panfletinhos no farol.

Papel sujo, você descartou em qualquer esquina da cidade.
Se você não faz questão, eu ajoelho e choro a tua ingratidão.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

O teu retrato

Nunca me destes teu retrato lindo
Nunca quisestes que eu contente o visse
E quando acaso eu o pedia rindo
tu me dizia: Não te dou, já disse!

Louca eu ficava, mas depois sorrindo
De novo com carinho e com meiguice
O teu retrato ia outra vez pedindo
E sempre ouvia: Não te dou, já disse!

E assim, tristonha e por demais descrente
Eu prosseguia sem ter, mas na mente
Doce esperança de ganhar um dia

Mas hoje, sem querer, Oh! Que alegria
Tenho no peito que o prazer devora
gravando aquele que me negaste outrora

Bragança, 05-10-1932

Aurora Alvarez

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

O que tem de novo?

Os dias são, e o tempo um fragmento: um culto, artificial-relógio: surgem as horas.

O vidente fala da fumaça no céu, promessas para santos: quebradas; as sete ondas no mar, oferendas para Yemanja, Ogum de ronda, Odociá.

O que tem de novo em chamar ano de novo? É tudo igual ontem, o que é hoje e o que é amanhã.

E, lá na mata, um indiozinho pergunta para o velho curandeiro: Mas Quanto tempo tem o tempo?